quarta-feira, 12 de março de 2008

Hanseníase: A Trajetória de um Grande.

Site do Hospital São Julião.

a Vida e a História de um Homem.

LINO VILLACHÁ era filho de um espanhol da Galícia (da pequena Villa Chá, daí o sobrenome) e de uma jovem russa, Anna Eudochack, imigrantes colonos em Terenos.

Aos 12 anos teve início sua Via Crucis. O bacilo da Hanseníase atingiu sua família. Assim pai, mãe e três dos cinco filhos tiveram que ir para a antiga Colônia São Julião. A infância livre no bairro São Francisco, a escola, o velho caminhão de lenha do pai, tudo isso foi trocado pelo isolamento daquilo a que estava reduzida a colônia.

O Hospital São Julião, inaugurado em 1941, fazia parte de um grande projeto de Getúlio Vargas. Mas, de hospital-modelo, havia se transformado numa cidade-fantasma, abandonada à própria sorte. O menino esperto, inteligente e curioso, cresceu convivendo com grandes pessoas escondidas atrás da máscara do sofrimento, que abriram seu coração a ele e passaram o melhor de si. Foi assim que diante dele foram passando figuras extraordinárias como o "Seu Botto", o professor, Maria, o velho Estanislão, Feliciana, que fizeram de Lino um cronista de seu tempo.

Em 1970, a antiga colônia passou às mãos de um grupo de, hoje diríamos "betinhos", que fundaram a Associação de Auxílio e Recuperação dos Hansenianos.

A A.A.R.H. mudou totalmente aquele "depósito de doentes" como era chamado, no mais moderno hospital de Hanseníase do país.

Lino embarcou junto nesse processo de evolução desde a primeira hora. Fundou a liga esportiva, organizou campeonatos de futebol, comemorações, ensinou, aprendeu e viveu intensamente.

As décadas de 50 e 60 tinham muito pouco a oferecer para os hansenianos: remédios, quase não havia, a doença, mesmo milenar, ainda era pouco conhecida. Havia sim, muito medo e o confinamento (por lei) nos leprosários.

Uma Vida Plena.

Talvez, só um poeta para explicar outro. Drummond diria:

"quando Lino nasceu, um anjo torto lhe disse: Vai Lino, vai ser 'gauche' na vida..."

Mas, como diz o Evangelho: "Lino crescia em graça e sabedoria". Em contrapartida, seu corpo sofria os ataques violentos do bacilo. Teve que amputar uma perna, depois a outra, as mãos se atrofiaram, os movimentos ficaram cada vez mais limitados, os rins já não conseguiam filtrar quarenta anos de remédios, cirurgias.

Só que ele seguia em frente, forte, lúcido, criativo, sempre agitador. Era o diretor da Escola, amarrava um lápis nas mãos em garra e datilografava poemas, entrevistas, crônicas, saudações aos amigos e autoridades. Logo depois passou para o computador, trabalhava na secretaria do hospital com dados, estatísticas, relatórios. Editou seis livros, publicados no Brasil e na Itália. Conquistou o respeito e a admiração de todos quantos puderam conhecê-lo pessoalmente ou ao seu trabalho.

Casou-se com Zena Maria em 1987 e dela teve amor e dedicação até o seu último momento. Zena foi seu anjo de guarda que ficou. Lino Villachá também é o nome da escola do Bairro Nova Lima e também da rua de acesso ao Hospital. Foi enterrado no Hospital em 11 de julho de 1995, às 11 horas, ao lado de muitas árvores, como ele pediu, num texto escrito numa manhã esplêndida de sol forte, céu limpo e muito verde.

Fazer poesia para Lino é pintar uma imagem com as cores dos nossos sentimentos...
"O poeta é um pintor que usa o pincel das palavras e a tinta das emoções..."

Íntegro:

"A maré da vida trouxe este monstro invisível que me persegue, noite e dia, reduzindo-me a farrapo humano. Quando o quis afastar esmagou-me as mãos, quando quis correr, ceifou-me as pernas... Cercou-me os caminhos, mas sempre encontrei uma brecha por onde passar com o que me resta e, ainda que eu seja nesse mar de sofrimento apenas uma concha no fundo, farei desta dor uma pérola para o mundo.
Não quero gritar, não amaldiçoarei quem me humilhou ou teve pena de mim. Meus amigos são a minha força. E a luz de Deus cobre-me de graça e me enriquece de amor e fé.
Por isso me sinto completo, mesmo faltando-me tudo..."

Fonte: site do Hospital São Julião: Site Externo.

Disponibilizado em: 8/08/2001.



Os Imprescindíveis.

Há homens que lutam por um dia e são bons.
Há outros que lutam por um ano e são melhores.
Há outros, ainda, que lutam por muitos anos e são muito bons.
Há, porém, os que lutam por toda a vida,
Estes são os imprescindíveis.

Bertolt Brecht.

Nenhum comentário: